quinta-feira, setembro 16, 2010

RUÍNA NA NEBLINA
a Theo Angelopoulos

O amor ao mito no divino olhar de Ulisses;
sempre voltando à casa, no retorno à terra
natal, Ítaca, onde o espera Penélope,
que aos importunos fielmente nega afeto.

Triunfante retornou, deslocado e só,
sem reconhecer o solo que tanto amou,
que fora transformado num campo minado
pelos difamadores do Templo de Delfos.

Exilado em seu próprio país adorado,
o herói silencia seu roteiro trágico,
pois a promessa de um mundo sem Homero
não passou de mera quimera libertária.

Caminha atordoado e sem retomar
o que fora perdido com o tempo ausente;
é um transeunte nauseabundo empedernido,
jogado à existência insensata de si

mesmo. Recontando, incansável, sua história,
no contraponto onde se encontram a verdade,
a insistente chuva, o frio e a solidão,
angustia-se na consumação do fato

de que, mesmo enganando o feroz Polifemo
e também revertendo os encantos de Circe,
o cercaram os fatos sombrios da guerra.
Tróia o tornou insensível, e de repente,

mais tarde, se viu obrigado a constatar,
que melhor seria estar, de modo fictício,
no escuro edifício de um cinema, a contar
sua triste história em trinta e cinco milímetros.

(Paulo Cruz)

Um comentário:

Miguel Garcia disse...

Amigo,

Filosofic-a-mente-e-o-coração expressando: como não amar e não reverenciar uma pessoa tão mar-av-ilhosa quanto vc? Como não render-me à beleza de seus arroubos poéticos? Eis-me bem perto dos dilêmas vividos por Critóbolo nos dias de Sócrates, ante ao fascínio que sua poesia exerce sobre mim (foge Critóbolo, foge! rs)! Vassum Crisso, amigo/irmão, Vassum Crisso!

Obrigado por vc existir meu amigo (sem vírgula)!